Muirakytan
Caicó

Muirakytan

Muirakytan Kennedy de Macedo, nasceu em 09/07/1964 na cidade de Caicó/RN e faleceu em 07/07/2021 em Natal/RN. Aposentou-se como professor da UFRN, campus Caicó, onde atuou nos cursos de graduação em História e no Mestrado em História no campus central (Natal/RN). Sempre se interessou por tudo de arte, especialmente a palavra poética, com apreço pelos clássicos e também pela produção popular, como cordéis. Entendia que modelar bonsais era uma forma de arte. Depois que se aposentou, por causa de um câncer de rim, retomou com mais intensidade o interesse por desenho, pintura, xilogravura. Pintou quadros, oratórios, tamboretes (experimentando também esculpir relevos nas peças), vasos de plantas. Em 2020, durante a pandemia, começou a pintar nas folhas de rosto dos livros que lia naquele ano e foram mais de 130 livros. Em alguns, pintava também certas páginas internas. Sempre foi autodidata, mas depois de alguns quadros produzidos, fez uns dois mini-cursos, mas não permaneceu muito tempo. A palavra poética foi sua primeira forma de expressão artística. Nas artes visuais não seguia um padrão estético, embora tenha se interessado em estudar todos os estilos, talvez pelo fato de ter sido professor de História da Arte. Também experimentava diversas técnicas. Tinha curiosidade em desenhar usando o pontilhismo, experimentava técnicas com grafite, carvão vegetal, acrílico, pastel, nanquim, óleo, aquarela, sempre utilizando uma diversidade de materiais específicos para esses experimentos. Primeiro ele estudou elementos do desenho mais realista, com o objetivo de dominar a técnica de representação, dentro dos padrões simétricos da composição, do traço, da perspectiva, das proporções e do jogo de luz, sombra e paleta de cores. Após a aprendizagem desses elementos, partiu para uma criação explorando a distorção das proporções. Nas últimas criações, voltou-se para a intervenção nas obras que lia. Isso tanto era um respeito pelo objeto livro que tanto amava, especialmente os de literatura, seu último refúgio, mas também um gesto de dessacralização da obra. A intervenção no livro era sempre após concluir a leitura. Só então esboçava, pintava, criava alguns versos e colocava tudo no seu instagram. Os temas eram variados: animais, pessoas, plantas, objetos do cotidiano. O que permanecia, na maioria das vezes, era a distorção da figura, o desmonte, o inusitado, como se assim, ele pudesse provocar o expectador a ver para além da realidade aparente. Alguns exemplos: velocípede desconjuntado, bicicletas com três aros e vários selins, bebês gorduchos com panelas na cabeça e um rato quebrando a atmosfera infantil, animais como peixes e nomes que não existem, criados pela pintura e por verbetes que ele inventava poeticamente para descrevê-los. Nas pinturas das folhas de rosto dos livros, as figuras podem ter três cabeças, um pescoço maior do que o resto do corpo, humano e máquina num mesmo corpo. Há em todas elas, além de uma espécie de estética do absurdo, a presença de uma antena. Talvez numa citação não verbal de Ezra Pound, o pintor estivesse reafirmando que as artes são as antenas da raça humana. Não comercializava nada. Nem mesmo a cota de livros que recebia das editoras que publicavam suas obras. Doava, além dos livros dessa cota, também grande parte dos livros que comprava. Presenteou muitos amigos com desenhos e pinturas. No fim, encaminhou a vida para um princípio cristão de compartilhamento, seja em contribuições a instituições de cuidado de idosos ou de pessoas doentes, seja se desapegando dos livros que amava para que outros pudessem ter acesso a eles. Uma vez participou de uma exposição no Centro de Ensino Superior do Seridó (CERES-UFRN). Não se interessava muito pelo reconhecimento, criar era mais importante, independia da avaliação externa. E nisso se diferenciava da produção acadêmica, esta ele sempre achava que precisava da avaliação dos pares. Muirakytan reunia o espírito de pesquisador que atravessa a alma do cientista e do artista. Sem confundir os métodos e rigores de cada área do conhecimento, toda sua criação era resultado do olhar investigativo. Um olhar, por assim dizer, estrábico, porque buscava as referências das suas origens, mas sem fechar-se nelas. Valorizava a intuição, a sensibilidade, os saberes populares, sem abandonar o conhecimento dos livros, do universo acadêmico. Era historiador e amava o Sertão, o Seridó, seu grande interesse de estudo. Observava e compreendia as contradições humanas, sempre atravessado e incitado pela arte. O espírito investigativo forjou o historiador, o professor, o artista, mas sempre associado a uma generosidade que o fazia se colocar a disposição de quem se aproximava dele com o desejo de crescer. Gostava de ensinar, mas também de aprender com o outro.

Texto gentilmente cedido por Ana Santana.